O leitor que abriu qualquer um dos grandes jornais na quarta-feira
(21/5) pode facilmente concluir que o Brasil não chega até o fim do ano.
A impressão que passa o noticiário é a de que a anarquia está solta nas
ruas, as instituições perderam o sentido e desapareceram os vínculos
que mantêm coesa uma sociedade.
O noticiário tem como carro-chefe uma greve-surpresa de motoristas de
ônibus em São Paulo, deflagrada logo após o anúncio de um acordo entre o
sindicato e as empresas e levada a efeito em uma série de ações
claramente planejadas para provocar o caos na maior cidade do país.
Tudo teria começado com uma dissidência do sindicato, conforme afirma a
imprensa? Difícil acreditar que uma articulação tão eficiente tenha
brotado de maneira espontânea, mobilizando grupos de ativistas para os
pontos onde suas ações iriam provocar o maior estrago possível. A
paralisação simultânea de mais de uma dezena de terminais, o assédio e
bloqueio de centenas de ônibus nas artérias mais importantes, de onde se
pode paralisar praticamente todo o trânsito da cidade, não foram
iniciativas isoladas.
Os jornais compram a ideia de que tudo se resume a uma disputa entre
candidatos a líderes da categoria dos motoristas. Os dissidentes,
responsabilizados pelo imenso transtorno que afetou cerca de 300 mil
cidadãos, seriam todos empregados de uma mesma empresa e teriam sido
derrotados na última eleição para a diretoria do sindicato.
A imprensa não se interessou em saber que grupo político eles
representam, uma vez que, como se sabe, as entidades de classe são
disputadas por facções ligadas a centrais sindicais, que por sua vez
servem de massa de manobra para partidos políticos.
Não há hipótese de que a tática extremamente eficaz, que provocou filas
de ônibus em pontos cruciais da cidade, muitos com pneus furados ou com
as chaves arrancadas ou quebradas, tenha sido decidida no momento. A
baderna foi organizada demais para ser aceita como uma explosão súbita
de descontentamento, mas a imprensa comprou essa versão.
Deu a louca no ministro
Também se pode colher nos jornais um punhado de decisões judiciais que
transferem a ideia do caos para uma instituição que deveria representar o
poder moderador na República: se levar em conta apenas o que diz o
noticiário de quarta-feira, o cidadão vai achar que a Justiça entrou em
pane.
O rol das trapalhadas começa com o ministro Teori Zavascki, do Supremo
Tribunal Federal, ordenando a soltura de todos os indiciados na chamada
Operação Lava-Jato e logo em seguida voltando atrás, alertado por um
juiz do Paraná de que alguns dos acusados poderiam aproveitar a
liberalidade para fugir do país.
Há também uma decisão estabelecendo o sigilo sobre operações da Polícia
Federal envolvendo toda a cúpula do governo de Mato Grosso, incluindo o
governador, ex-governador, senadores, deputados e empresários, em
investigação sobre lavagem de dinheiro. A iniciativa de blindar as
informações foi do procurador-geral da República, acatada pelo ministro
do STF José Antônio Dias Toffoli.
Entra no pacote das notícias que causam estranhamento a decisão do
presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, que provocou
novo ponto de atrito com o Poder Executivo ao atuar em favor de uma
Proposta de Emenda Constitucional que transforma em letra morta o limite
legal para o teto de vencimentos de servidores públicos. Barbosa quer
ver aprovada a criação de um adicional por tempo de serviço de 5%,
aplicável a cada cinco anos, sobre os vencimentos de todos o magistrados
brasileiros, além dos integrantes do Ministério Público federal e
Estadual. Tudo isso, claro, na melhor das intenções corporativistas.
Como o benefício teria efeito retroativo, o aumento pode ser estendido
aos servidores aposentados e pensionistas do sistema judiciário,
produzindo uma bola de neve capaz de causar imensos transtornos ao
Tesouro. Com base na mesma norma, muitas outras categorias profissionais
poderiam requerer isonomia, o que tornaria impossível manter o
planejamento de gastos públicos já a partir deste ano e levaria riscos à
governabilidade.
O leitor que se debruçar sobre as páginas dos jornais vai chegar à
conclusão de que deu a louca em sua Excelência, mas sua Excelência é
aquilo que é.(fonte: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/uma_baderna_organizada)
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