por Marcelo Hailer, na revista Fórum
Em artigo publicado na edição deste domingo (29) do jornal Folha de São Paulo,
o colunista Samuel Pessôa defende a taxação dos cursos de graduação e,
para tanto, faz uma comparação com o pedágio urbano, argumentando que “o
pedágio urbano justifica-se por que um bem econômico público, as vias
públicas, torna-se um bem econômico privado quando se congestiona. A
natureza econômica das vias públicas altera-se de acordo com a
intensidade do seu uso”.
Na sequência, ele faz a comparação entre o pedágio urbano e o ensino
superior público, e afirma que a “atividade de pesquisa constitui um bem
público, enquanto a atividade de ensino constitui um bem privado”. Ou
seja, o articulista do jornal paulista se utiliza de “literatura
econômica” para dizer que a pesquisa é um bem público, pois visa a um
bem comum, um ganho à sociedade, assim como a via pública. Já a
graduação trata-se de um “bem privado”, pois quando o profissional
estiver graduado, seu bem será medido pela sua renda, dando a entender
que o saber adquirido na universidade fica para ele. Mas, já que ele
cita as pesquisas, fica o questionamento: as pessoas que se tornaram
mestres e doutores não adquiriram um primeiro conhecimento na graduação?
Em seguida, o autor do texto cai em contradição ao dizer que a
educação fundamental tem de ser pública, pois, quanto mais jovens
alfabetizados, mais a sociedade ganha, já que a formação de base não
necessariamente aumenta o ganho salarial, mas sim o social. “Faz todo
sentido, portanto, que a educação básica seja gratuita e não faz sentido
que a educação universitária seja gratuita”, sacramenta o articulista.
E sem papas na língua, ele defende que o “ensino universitário deve
ser pago” e, àqueles alunos que não podem arcar com o ensino superior, o
autor indica o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) e nem sequer
cita o Programa Universidade Para Todos (ProUni), que garante milhões de
bolsas em instituições privadas anualmente sem que o aluno tenha que
pagar posteriormente, como acontece com o primeiro.
Para justificar a sua tese de privatização do ensino superior, Pessôa
argumenta que “haveria impactos orçamentários positivos”. “A
instituição de cobrança de mensalidade para os cursos universitários
públicos teria efeito importante sobre a eficiência das universidades. O
tempo médio seria reduzido e a vinculação ao curso aumentaria”.
Poderíamos encarar tal texto como mais um entre tantos de cunho
neoliberal que defendem a privatização do ensino superior público, mas o
artigo deve receber um pouco mais de atenção, visto que Samuel Pessôa faz parte de
uma espécie de conselho curador da equipe de Aécio Neves – candidato à
presidência da República pelo PSDB -, que está ajudando na construção do
plano de governo dos tucanos.
Ou seja, mais do que um mero texto publicado em um semanário,
trata-se de uma tese pronta para, caso Aécio vença as eleições, ser
apresentada como solução para os problemas financeiros nas
universidades. O que espanta nas linhas de Samuel Pessôa é que o autor
ignora que hoje 70% das bolsas do ProUni são integrais e isso tem feito
com que milhares de alunos de camadas mais populares ascendam ao estudo
universitário e rompam com ciclo da pobreza. Outro fator ignorado é que
agora o PrUni vai ser estendido ao Mestrado e Doutorado e, assim, quem
sabe, levar à pós-graduação saberes que são historicamente silenciados.
Podemos supor, então, que a partir do momento em que o autor ignora
tais programas e cai em contradições rasas ao “defender” o ensino de
base enquanto público e o superior a ser cobrado, ou seja, a velha
ideologia neoliberal, propõe fechar as universidades aos mais pobres e
manter as portas abertas apenas àqueles que podem pagar.
Devemos ainda reparar que o autor não cita uma linha sequer sobre o
escândalo financeiro da USP. A direção da instituição leva a
universidade à falência e o boleto deve ser passado aos alunos? A velha
cantilena do Estado mínimo não está nada morta, muito pelo contrário:
viva e assanhada por retomar o ciclo de políticas dos anos 1990.
Por fim, o que se nota é que o filho do pedreiro com diploma de
médico incomoda sim muita gente e, a depender dos conselheiros de Aécio
Neves, o filho do pedreiro vai continuar a ser o filho de pedreiro… Mas
que isso, né, minha gente, quanta amargura. Ele vai ter ensino básico
gratuito, não é mesmo?
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