A ideologia da competência dá a ideia de trabalhador que os seguidores do fordismo desejam.
A ilustração que segue é uma tropa de burros sofrendo de cabeça baixa e trabalhando em silêncio.
Ideologia da competência
Para Marilena Chaui (2014; 51) a função
da ideologia é dar aos membros de uma sociedade dividida em classes, uma
explicação racional para as diferenças sociais, políticas e culturais. Essas
explicações jamais atribuem as diferenças à divisão da sociedade em classes, a
partir das divisões na esfera da produção econômica. Portanto, a função da
ideologia é ocultar a divisão social das classes, a exploração econômica, a
dominação política e exclusão cultural. A ideologia faz os indivíduos se
sentirem iguais com o ideal de liberdade, justiça e nacionalidade. Mas, na
verdade, são as idéias e valores das classes dominantes, aceitas sem críticas
por todos.
A filosofia de Henry Ford, em 1914,
estabelecia normas de racionalização da produção capitalista, baseadas na
inovação tecnológica, tendo em vista a produção e consumo em massa. O objetivo
principal do método fordista era o de diminuir o custo do produto na linha de
montagem. O trabalhador executava tarefas repetitivas, intensas e desgastantes.
Tornava-se um animal que devia obedecer ao ritmo da máquina e da esteira
rolante. Para permanecer no emprego o trabalhador tinha que ser mais que
humano. Além disso, o salário pago ao trabalhador e as garantias sociais de
sobrevivência eram mínimas. O resultado do fordismo foi uma enorme concentração
de renda, aumento da pobreza e do desemprego, que culminaram com a crise de
1929.
O filme “Tempos modernos”, de
Charles Chaplin, foi uma das raras críticas ao fordismo. No filme “O grande
ditador”, Chaplin coloca na boca do personagem principal, figurado como Hitler,
o discurso de observação do momento da segunda guerra mundial. – O caminho da vida pode ser o da liberdade e
da beleza, porém desviamo-nos dele. A cobiça envenenou a alma dos humanos.
[...] Criamos a época da produção veloz, mas nos sentimos enclausurados dentro
dela. A máquina que produz em grande escala, produz a escassez. Esse discurso foi tão contundente, que Chaplin
acabou sendo expulso dos EUA.
Existe um modelo de organização que
se expande por todos os setores da vida social, empresas, serviços e estado. A
organização é exercida por um corpo de agentes que se esforça para ser
eficiente, na medida em que se identifica com ela e seus objetivos. Cada um tem
sua posição e seu papel e procura subir na escala hierárquica. A organização
divide e separa os que possuem conhecimento, isto é, os gerentes e
administradores e os que executam as tarefas fragmentadas, os
trabalhadores. Desta forma, a divisão
social do trabalho faz-se pela separação entre os que têm competência para
dirigir e os incompetentes, que só sabem executar. (CHAUI, 2014: p.55).
A hierarquia, em todos os setores da
sociedade, como empresa, serviços públicos, serviços privados, onde há grande
complexidade organizacional, se faz pelo nível de conhecimento. Quanto menor
for o grau de instrução do trabalhador, mais simples será a sua função.
Conseguir escalar a montanha da estrutura social significa o domínio da
tecnologia e do conhecimento. Quem consegue se mover para cima é considerado
competente. Ainda segundo Chaui, o discurso competente é aquele proferido pelo
especialista, que ocupa uma posição ou um lugar determinado na hierarquia
organizacional. Os demais cidadãos são rebaixados à condição de incompetentes.
Os especialistas competentes
adquirem o direito de nos tornarmos seus dependentes. O obeso torna-se
dependente do nutricionista, e o diabético do endocrinologista. Na medida em que
somos invalidados como incompetentes, tudo precisa nos ser ensinado. Os
programas de rádio e de televisão estão cheios de “sábios” ensinando como faz a
tosa do cão; a dieta do gato de estimação e tantos outros. Certa vez um
ginecologista, em um programa de televisão, disse que as mulheres deveriam usar
calcinhas de tecidos finos, porque a vagina precisa de muito oxigênio. Essas e
todas as modalidades de competência são absorvidas pela indústria cultural.
Durante a campanha eleitoral para
presidente da República e governadores de estados, os candidatos começam
indicar para ministros e secretários de estado, altos executivos de empresas
privadas. Os candidatos de tendência neoliberal acreditam que esses executivos
são os mais competentes. A falsa premissa é de que, se estes foram bem
sucedidos nas empresas, farão o mesmo na administração pública. Grande engano:
os empresários e os executivos providos em cargos públicos são os mais
corruptos e ineficientes.
Referências:
CHAUI,
Marilena. A ideologia da competência.
Belo Horizonte: Autêntica, 2014.
LEFORT,
Claude. Esboço de uma gênese da ideologia
nas sociedades modernas. São Paulo: CEBRAP, 1974.
Belo
Horizonte, setembro de 2014.
Antônio
de Paiva Moura
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