O segundo debate público entre candidatos à Presidência da República
pela televisão, ocorrido na noite de segunda-feira (1/9), consolida a
percepção de analistas da imprensa de que o ex-governador Aécio Neves
tem remotas chances de vir a disputar um eventual segundo turno. Mais do
que as conjecturas de especialistas que destrincham os detalhes das
duas mais recentes pesquisas de intenção de voto, pesa contra o
candidato do PSDB uma declaração do coordenador de sua própria campanha,
José Agripino Maia (DEM-RN), de que a coligação vai apoiar a
ex-ministra Marina Silva (PSB) na disputa direta com a presidente Dilma
Rousseff.
Os jornais de terça-feira (2/9) ressaltam a nova polarização da
disputa, agora entre Dilma e Marina, e o fato de que Aécio Neves
permaneceu quase todo o tempo do debate em segundo plano, disparando
críticas contra a presidente e evitando confrontar diretamente a
candidata do PSB.
O momento delineado pelo encontro dos presidenciáveis no estúdio do
SBT, em São Paulo, é o da consolidação de Marina Silva no primeiro plano
do jogo eleitoral, mas a dinâmica dos acontecimentos e a própria
natureza da aliança que a suporta tendem a oferecer grandes surpresas.
Marina Silva começa a enfrentar os efeitos da contradição que
personifica, na qualidade de candidata que se propõe a reformar os
costumes políticos mas cujo sucesso depende de certa flexibilidade, para
não dizer jogo de cintura, para conservar apoios tanto entre religiosos
radicais quanto entre militantes de causas com alto potencial de
controvérsia.
Originada no campo avançado da política progressista, aquele que propõe
substituir as bandeiras da esquerda clássica pelo ideário da
sustentabilidade, ela submeteu sua racionalidade à racionalização da fé
religiosa. Como candidata, precisa agora conduzir essa ambiguidade no
perigoso jogo do poder político. Para se eleger, a insustentável leveza
de Marina precisa de um programa consistente e sólido. Resta saber se
conseguirá resistir às tormentas da campanha, tendo que se equilibrar
constantemente com cada pé apoiado em uma canoa.
Entre dois senhores
Marina Silva procura se apresentar como uma obra em progresso, aquilo
que o compositor celebrizou como uma “metamorfose ambulante”. Mas corre o
risco de ser vista mais propriamente como borboleta que regride ao
estado de lagarta.
O discurso da sustentabilidade não sobrevive longe do berço da ciência,
que lhe deu origem e credibilidade. Ao fazer concessões ao campo
oposto, o da religião obscurantista, ela perde o vínculo com a raiz de
sua persona política.
Entre sua fé religiosa e a conveniência de apoiar políticas de
igualdade entre os gêneros, ou a autonomia da mulher sobre seu próprio
corpo, ela tenta convencer o eleitorado evangélico de que segue fiel aos
seus dogmas, ao mesmo tempo em que precisa defender propostas que a
situem no centro das questões contemporâneas.
Entre suas originais convicções ambientalistas e a suposta necessidade
de agradar as forças conservadoras do agronegócio, ela procura preservar
o respeito dos adeptos do ideário que a colocou no mundo da política,
ao mesmo tempo em que tenta convencer o capital agrário de que pode
confiar nela.
A rigor, ela não precisaria fazer tantas concessões. O carisma que
cultivou ao longo da carreira a faz maior que o PSB, e ainda maior que a
aliança onde apoia sua candidatura. Se vencer frustrando seu eleitorado
histórico, submetendo seu programa de governo aos ditames de
manipuladores da fé religiosa e aos oportunistas da política que diz
combater, estará conduzindo a retrocesso todo o movimento que sustentou
sua carreira até aqui. Se mantiver sua fidelidade aos valores que a
transformaram em fenômeno político, pode vencer sem ter que entregar sua
alma aos demônios do poder.
A imprensa ressalta suas contradições e a pressiona para que assuma uma
posição mais conservadora, na qual supostamente receberá mais apoio
para a campanha. Para usar a doutrina a que a cidadã Marina Silva se
obriga como evangélica, pode-se dizer que a candidata Marina Silva
incorre no risco sobre o qual alertava o pregador, segundo o livro de
Mateus, capítulo 6, versículo 24:
(fonte: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/mateus_capitulo_6_versiculo_24)
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