Antônio de Paiva Moura
Em 2007 foi dado início à execução
do projeto Minas-Rio, cujo objeto é construir o mineroduto de Conceição do Mato
Dentro ao porto Açu, município de São João da Barra, estado do Rio de Janeiro,
para exportar minério de ferro bruto, sem nenhum tipo de beneficiamento. Para
impulsionar o minério nos dutos, o processo vai levar de Conceição do Mato
Dentro cerca dois mil e quinhentos metros cúbicos de água por hora, privando o
município de uma de suas vitais riquezas.
Para que o projeto fosse autorizado
sem resistências locais e no âmbito do estado de Minas Gerais, a mineradora do
empresário Eike Batista instalou no município uma empresa de falso caráter
pecuário para facilitar as desapropriações. A Borba Gato Pastoril SA chegou em Conceição, em 2007
procurando comprar terras para criação de cavalos. Esse subterfúgio acabou
evitando que o verdadeiro objeto da mineradora causasse resistência à venda das
propriedades. (ZHOURI, 2014) Até então, a base da economia de Conceição do Mato
Dentro era a agricultura familiar e o ecoturismo. Segundo Zhouri, esse processo
foi interrompido quando o governo de Minas, juntamente com algumas empresas,
decidiu que sua “vocação” era ser cidade mineradora.
Após o início das atividades da
empresa, córregos e rios passaram a apresentar qualidades impróprias para uso.
Produtores rurais tiveram inviabilizado o plantio de alimentos, fabricação de
queijos e doces e viram seus animais adoecerem e morrerem. Em 2014, abaixo da
barragem de rejeitos da empresa, no córrego Passa Sete, ocorreu uma grande
mortandade de peixes. O projeto Minas-Rio defendido como desenvolvimento pela
empresa e pelo governo de Minas, reforça a subordinação do Brasil ao Mercado
internacional, como mero fornecedor de matéria prima bruta.
Em 2008 o projeto foi vendido para a
Anglo American, que tem sede em Londres e que, no ano de 2012, teve um
faturamento de U$ 28,7 bilhões de dólares. Essa empresa tem uma longa história
de conflitos com a classe trabalhadora nos países em que atua. Em Conceição do
Mato Dentro não é diferente. Em audiência pública na Assembléia Legislativa de
Minas Gerais, em 2013, o promotor público estadual, Marcelo Mata Machado listou
os conflitos na região que incluem: violação de direitos trabalhistas; grilagem
de terras; assoreamento de córregos e rios; coação da população no sentido de
não transitar nas estradas; destruição do meio ambiente; poluição dos
mananciais; invasão de terras pela empresa; destruição de casas de moradias;
agravamento do problema de moradia, saúde, escola e segurança. Em 2013, um
incêndio oportunizou o aumento dos protestos de oitocentos trabalhadores da
Anglo American, em face das más condições de trabalho e não pagamento de horas
extras. Uma subsidiária da Anglo foi denunciada por manter trabalhadores em
condições análogas à escravidão, incluindo cerca de cem haitianos.
A questão fundiária passa por uma
esperteza e demonstração de força da Anglo American. A empresa negocia a posse
da terra com alguns membros da família. Sem concordância de todos os herdeiros.
A partir daí proíbe a entrada dos moradores e herdeiros nos terrenos e o acesso
a caminhos tradicionais.
Do ponto de vista ambiental, a Anglo
conseguiu todas as licenças requeridas, inclusiva algumas não previstas na legislação,
como, por exemplo, a divisão do licenciamento em fases. Com a aquiescência do
governo mineiro, foi inventada a fórmula: “vamos por etapas”. Na análise de
Zhouri, isso indica que houve forte interesse de pessoas dentro dos órgãos
ambientais de Minas, para que o projeto fosse aprovado. Estranha-se o fato de
Daniel Medeiros de Souza, superintendente de regulamentação da Secretaria de
Estado do Meio Ambiente ter-se demitido para assumir alto cargo de
licenciamento na Anglo American. Apesar de condições nada favoráveis e
divergências nos órgãos de licenciamento ambiental, em outubro de 2014, o
projeto foi aprovado.
A proposta de Minas Gerais e do
município de Conceição do Mato Dentro de construção de ferrovia para
transportar minério de ferro, foi preterida. Minas Gerais foi derrotada em sua
perspectiva de desenvolvimento e não consegue evitar o desastroso ato de
economia insustentável.
Referência
ZHOURI,
Andréa (e outros). O projeto Minas-Rio:
negociando os direitos... dos outros!. Le Monde diplomatique Brasil. São
Paulo, n. 88, novembro de 2014.
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