Chegou a mim por email. Desconheço o autor. Mas suas ideias valem uma discussão!
Dener Giovanini
31 janeiro
2015 | 14:40
Ao contrário do que governos, imprensa e até
organizações ambientalistas afirmam, não existe nenhuma crise hídrica no
Brasil. Classificar o que está acontecendo com os recursos hídricos nos maiores
Estados do país como “crise” é reduzir e limitar a real compreensão dos fatos.
Crises são acontecimentos abruptos e momentâneos.
Um momento difícil na existência, quando enfrentamos – na maioria das vezes –
situações quase sempre alheias a nossa vontade.
Podemos ter uma “crise renal” quando o nosso corpo
sofre um ataque bacteriano ou quando as nossas funções nefrológicas falham
subitamente. Podemos ter uma “crise no casamento” quando os cônjuges descobrem
segredos ocultos ou quando se desentendem por alguma razão. Podemos ter uma
“crise ministerial” quando algum ministro fala pelos cotovelos ou quando o seu
chefe imediato o desautoriza em público. Podemos ter uma “crise financeira”
quando perdemos o emprego ou quando enfrentamos uma doença na família. Podemos
ter uma “crise política” quando os representantes do povo são pegos com a boca
na botija ou quando o governo, não tendo mais como explicar desmandos, resolve
censurar os críticos. Crises, como dito, são manifestações que nos pegam de
surpresa, no pulo.
Outra característica de uma crise é a sua
temporalidade. Crises sempre acabam. Para o mal ou para o bem, em algum momento
cessam. Crise que não cessa não é crise. Crise contínua não é crise, é doença
crônica. Na relação conjugal, ou acaba a crise ou acaba o casamento.
Nenhuma dessas características acima se aplica ao
quadro de escassez de água em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais ou
Espírito Santo. A água não acabou do nada, de repente. E muito menos será uma
situação passageira. O quadro que se instalou nesses Estados, particularmente
em São Paulo, é irreversível. Pelo menos para o paulistano que nasceu na data
de hoje. Ele, por mais longeva vida que tenha, não viverá como viveram seus
antepassados.
A falta de água não é uma “crise”, porque ela não é
fruto de um acontecimento imprevisível. Não se trata de um capricho de São
Pedro que, de uma hora para outra, resolveu castigar a Região Sudeste. Há mais
de 10 anos os governos tinham informações técnicas confiáveis que as torneiras
iriam secar a médio prazo.
A falta de água não é uma “crise” porque ela não
será passageira. Os fatores que levaram ao esvaziamento das represas não
cessarão subitamente. Recuperar as Matas Ciliares que protegem os rios do
assoreamento, reflorestar grandes áreas para manter a perenidade das nascentes,
cessar o desmatamento da Mata Atlântica e da Amazônia, substituir uma prática
agrícola predatória e, principalmente, adotar um novo modelo de
desenvolvimento, não são medidas fáceis de serem adotadas e muito menos elas se
encontram presentes na agenda dos atuais governantes. Quem acreditar nisso
estará sendo, no mínimo, ingênuo. No caso dos políticos que tentam se
justificar – chamando de crise o que permanente será – é pura leviandade mesmo.
Por maiores que sejam os dilúvios que possam cair
sobre as regiões que hoje enfrentam a escassez de água, a situação não irá
mudar. E não mudará porque não existem sinais de que mudaremos as nossas
práticas cotidianas. Os reservatórios até poderão encher, mas as razões que os
levaram a secar continuarão e eles novamente voltarão a ser o que são hoje:
terra seca. O nosso “balde natural” furou. E o rombo é muito maior do que a
boca da torneira que o enche.
O que acontece hoje em São Paulo e que se espelha
em outras regiões do país, também não é um fenômeno natural. Aliás, eventos da
natureza são absolutamente previsíveis. Até terremotos e tsunamis são cada vez
mais antecipados pela ciência. Erupções Vulcânicas são identificadas meses
antes de ocorrerem. Não existem “crises sísmicas” ou “crises vulcânicas”. Assim
como não existem “crises hídricas”.
Em se tratando de natureza, tudo é extremamente
previsível, direto e muito simples: apesar de ser existencialmente complexo em
sua essência, o ciclo da vida no planeta reage imperiosamente contra quem tenta
interrompê-lo. A natureza nunca privilegiou os fracos ou os “desajustados”.
Para continuar existindo, o ciclo da vida se renova constantemente a fim de
eliminar as ameaças.
Se não é uma crise, o que são então aquelas imagens
de represas e açudes vazios? Simples a resposta: um colapso. Um “Colapso
Hídrico”!
Um colapso significa falência, esfacelamento e
esgotamento.
O colapso, ao contrário de uma crise, não é
passageiro.
O colapso, ao contrário de uma crise, é
perfeitamente previsível.
O “Colapso Hídrico” se instalou porque esgotamos
o atual modelo de desenvolvimento, que privilegia a distribuição de lucros em
detrimento dos investimentos em pesquisa e conservação ambiental.
O “Colapso Hídrico” está acontecendo porque esfacelamos
todas as oportunidades de adotarmos políticas públicas que priorizassem a
modernização dos nossos recursos tecnológicos, para que diminuísse a pressão
sobre os recursos naturais.
O “Colapso Hídrico” continuará porque o nosso
sistema político está totalmente falido e não é mais capaz de planejar a
médio e longo prazo.
O Brasil está começando a vivenciar o seu primeiro
colapso ambiental. Outros virão. E as consequências são imprevisíveis. Um país
que reduz 95% da Mata Atlântica, que incentiva a emissão de gases poluentes,
através de políticas fiscais que estimulam o uso do transporte individual, que
ignora a sistemática redução dos Biomas, que mantém uma produção agrícola
ultrapassada, que produz leis como o Código Florestal e, principalmente, que
elege políticos que não têm nenhum compromisso, a não ser com a perpetuação do
poder para sustentar suas máquinas partidárias, está fadado a colapsar.
A primeira e – a mais importante – medida que
devemos adotar agora é assumir a realidade como ela é. Devemos ser francos e
admitir que o que estamos vivendo não é uma crise e sim um colapso. O fim de um
ciclo econômico que falhou.
Não compreender – e aceitar – a diferença entre uma
crise e um colapso é o mesmo que tratar gripe e câncer com chazinho caseiro. A
gripe até pode passar, o câncer não. Ele sempre evolui. E para pior.
As Polianas de plantão – principalmente aquelas que
têm um grau maior de responsabilidade sobre o que está acontecendo – vão taxar
esse texto de extremamente pessimista. Vão continuar espalhando sua visão
romântica sobre o mundo, enquanto as gotas nas torneiras continuarão sumindo.
Mas a verdade é que o sonho acabou. Ou mudamos ou
sumimos. Simples assim.
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