Um solo produtivo leva de três mil a 12 mil anos para a sua formação, e o aumento da desertificação no mundo desmascara a 'eficiência' do agronegócio.
Najar Tubino
É uma decisão da ONU, que desde 2013 também
definiu o dia 5 de dezembro como o dia mundial do solo. Em maio, entre
os dias 4 e 7, ocorrerá a Conferência Internacional do Solo na Albânia
com o lema: “O solo sustenta a vida: muito lento para formar, rápido
demais para perder”. Um centímetro de solo demora entre 100 e 400 anos
para se formar, e os pesquisadores calculam que um solo produtivo dentro
da normalidade leve de três mil a 12 mil anos para a sua formação.
Mesmo assim, a ONU calcula que até 2050 o mundo perderá um Brasil
inteiro em solo, ou seja, 849 milhões de hectares. São 12 milhões de
hectares por ano. O que é mais importante: somente 5 a 10% dessa terra
chegam ao mar. Onde fica o restante? No leito dos rios, no lago das
represas, tanto de abastecimento de água, como das hidrelétricas, nos
córregos, nos afluentes. Como dizem os chineses: os rios do planeta
estão empanturrados.
A degradação avança em todo o mundo
A
matemática é simples: se nada for feito para deter a erosão e o
desmatamento, os dois principais fatores da degradação dos solos, em 20
anos teremos perdidos mais 240 milhões de hectares, calculando 12
milhões ao ano, como faz a ONU. Em 1991, 15% das terras cultiváveis do
planeta estão se degradando, agora são 24%. Eram 110 países que sofriam
com o problema da erosão e com o aumento da desertificação, agora são
168.
“-Veja
o caso da África, cita o secretário da Convenção contra a
Desertificação, que é o continente mais vulnerável à seca e à degradação
dos solos. A situação atual aponta para 45% do solo afetado pela
degradação e admite-se que dois terços podem ser perdidos até 2025”, diz
Luc Gnacadja.
Ele
completa: “até agora a resposta humana à degradação dos solos e ao
avanço da desertificação tem sido derrubar mais área de floresta para
aumentar a fronteira agrícola”.
Mundo urbano não discute o rural
Um
texto sobre outra conferência – em Brasília, entre os dias 25 a 27 de
março- cita alguns argumentos sobre a importância do solo:
“-
Os solos constituem insumo fundamental para o desenvolvimento humano.
Nenhum país consegue desenvolver-se plenamente sem acesso a esse recurso
natural e as suas riquezas são incalculáveis. Em interface com a
atmosfera, a hidrosfera, a biosfera e a litosfera o solo é responsável
pelos principais processos biogeoquímicos que garantem a vida na Terra,
estoca a água e recicla nutrientes, protege contra enchentes, sequestra
carbono e abriga 25% da biodiversidade”.
Ocorre
que o mundo atual é urbano, digital, eletrônico e não comporta espaço
nem discussão sobre assuntos considerados rurais, do campo, de outra
esfera. A não ser quando da realidade bate a porta e começa a sumir a
água das torneiras e, de repente, milhões ficarão sem água, como
acontecerá em 2015 em São Paulo. É o que diz um trabalho divulgado pela
The Nature Conservancy sobre o problema da falta de água nas grandes
cidades.
Detonaram o mato dos mananciais
Se
14,3 mil hectares dos 493,4 mil hectares que formam os sistemas
Cantareira, Alto Tietê, Guarapiranga e Rio Grande fossem reflorestados
com mato nativo, isso diminuiria em 568,9 mil toneladas de sedimentos
que são jogados nos cursos d’água, que alimentam os reservatórios.
“-
A sedimentação tem impacto direto na quantidade e na qualidade da água
dos mananciais. Isso ocorre porque não há cobertura vegetal ao redor dos
rios e das represas. O solo exposto, além de sofrer erosão e não
absorver a água das chuvas provoca o escoamento da terra para os corpos
d’água, assoreando o leito e diminuindo a vida útil dos reservatórios”,
como explica Samuel Barreto, coordenador do Movimento Água para São
Paulo.
A
região dos mananciais já perdeu 70% da mata nativa para a pecuária e
agricultura. Os números levantados pela organização não governamental
SOS Mata Atlântica são piores – só restam 488km2, ou seja, 21,5%. Não se
trata de uma novidade brasileira. A erosão na China já consumiu 19% da
área agrícola e os números apontam para descarga de terra superior no
rio Yang-Tsé, o maior da Ásia, superior as dos rios Nilo e Amazonas
juntos – três bilhões de toneladas ao ano.
Colapso do sistema público de água
Em
2015, justamente quando o assunto solo poderá ganhar as páginas da
mídia ordinária, o país será usado como exemplo do que pode ocorrer na
maior metrópole, a falta de água nas torneiras paulistas. O Centro de
Desastres Climáticos, do INPE calculou as estimativas de chuvas até
abril – mesmo com fevereiro acima da média-, além do que a SABESP retira
do sistema Cantareira. E a previsão é que o sistema seca em julho. No
início de dezembro passado ocorreu um encontro na Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade da USP, sobre as perspectivas de
abastecimento de água na região metropolitana de São Paulo. O professor
Pedro Luiz Cortês, da Uninovo, coordenador do encontro, disse:
“-
Temos um sistema cada vez mais suscetível a eventos climáticos, como
secas prolongadas, além do consumo cada vez mais intenso. Desde 2012
sabíamos que entraríamos num regime de falta de chuvas. O governo
deveria vir a público apresentar os cenários com os quais está
trabalhando”.
Outro comentário, agora do professor Reginaldo Berto, do Centro de Pesquisa de Águas Subterrâneas, da USP:
“- É preciso se preparar para o colapso do sistema público de abastecimento a partir de abril de 2015”.
(fonte: http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Meio-Ambiente/Desertificacao-por-que-este-assunto-nao-esta-na-capa-dos-jornais-/3/32899)
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