País planeja redistribuir a cada cidadão 800 euros mensais, sem
contrapartida em trabalho. Benefício substituirá medidas caritativas.
Autor da proposta debate seu caráter transformador
Por Sirin Kale, na Vice
A Finlândia planeja se desfazer de seus benefícios de assistência
social e os substituir por uma renda básica universal disponível para
todos os finlandeses – independentemente de quanto eles ganhem.
Apesar de os detalhes ainda não estarem acertados, um plano piloto
pagaria 550 euros [quase R$ 2.250] aos finlandeses por mês (junto com
outros benefícios). Se o piloto tiver sucesso e o esquema for aplicado
nacionalmente, os finlandeses receberão 800 euros [R$ 3.270] por mês sem
impostos, substituindo vários outros benefícios que recebem atualmente.
No Reino Unido, uma renda básica foi proposta
pelo Partido Verde em seu Manifesto das Eleições Gerais de 2015,
afirmando que isso pouparia ao país 163 milhões de libras [R$ 920
milhões] anualmente, em termos de benefícios.
No entanto, antes de começar a planejar sua mudança para a Finlândia,
vale apontar que a proposta de renda básica só será preparada
oficialmente pelo governo finlandês em novembro de 2016; então, isso
ainda está longe de acontecer, segundo a imprensa local.
Apesar de ser socialmente liberal, a Finlândia vem sofrendo
economicamente nos últimos anos com um aumento do desemprego e
crescimento limitado. Isso pode parecer contraintuitivo, mas alguns
economistas argumentam que dar a todo mundo uma renda básica – mesmo
para aqueles sem necessidade – pouparia dinheiro dos contribuintes a
longo prazo.
A VICE conversou com o professor Guy Standing,
especialista em economia da Universidade de Londres. Cofundador da
Basic Income Earth Network, ele está fazendo consultoria para essa
proposta do governo finlandês.
Por que as pessoas querem uma renda básica? Não é mais fácil dar benefícios apenas para pessoas que precisam?
Guy Standing: O que você está descrevendo é uma
verificação dos meios de sobrevivência, e há muitos sinais de que é um
processo frágil. Você precisa medir a renda das pessoas e comprová-la, o
que produz todo tipo de erro. Por exemplo, as pessoas não sabem o que
contar como renda, ou sua renda da última semana pode ser diferente da
média dos últimos três meses.
Quem mais se beneficiaria com a introdução de uma renda básica?
Primeiro, as pessoas que geralmente têm desvantagem nas verificações
de meios de sobrevivência, porque não sabem como operar esse sistema. Ou
seja, pessoas vulneráveis – migrantes, por exemplo. Segundo, a classe
dos precários. Aquelas pessoas que as políticas da assistência social
não conseguem alcançar. Pessoas que fazem trabalhos casuais, cuja renda
flutua o tempo todo. Fornecendo uma renda básica, você dá a elas algum
grau de estabilidade.
Se você der dinheiro para todo mundo, as pessoas não vão simplesmente ficar em casa assistindo à TV o dia inteiro?
Evidências mostram que uma renda básica aumenta o incentivo para
trabalhar. Quando você tem verificações de meios de sobrevivência e só
oferece os benefícios a quem tiver uma renda baixa, quem eleva sua renda
com trabalhos extra acaba perdendo o que o Estado lhe paga. Logo, as
pessoas ficam presas num ciclo de pobreza.
Quando uma renda básica, você remove esse ciclo e incentiva as
pessoas a obter mais renda, já que elas ficam com o dinheiro extra.
Além de poupar dinheiro da assistência social, quais são os outros benefícios?
Uma pesquisa na Índia descobriu que benefícios assim reduzem custos
na saúde pública, pois as pessoas têm acesso a uma nutrição melhor.
Quando você repassa mais dinheiro para grupos de renda baixa, eles
gastam em bens e serviços básicos que estimulam o crescimento econômico.
Assim, você aumenta a receita dos impostos.
Não é estranho dar a pessoas de alta renda financiamento do Estado que elas não precisam?
É mais fácil para o governo dar dinheiro a todos universalmente em
vez de tentar descobrir quem é pobre e quem não é. Em contrapartida,
você pode tributar mais intensamente aqueles com renda maior.
Quais são os pontos negativos?
Bom, há sempre o custo inicial para a introdução de grandes reformas
de assistência social. Nesse caso, quando você introduz um sistema
integrado de taxa de benefício, há certos custos envolvidos na
administração eletrônica de tal sistema. Outro argumento que já ouvi no
passado – particularmente de sindicatos – é que, se as pessoas têm uma
renda básica, elas não podem fazer pressão para que os empregadores
aumentem os salários.
É possível ver outros países introduzindo uma renda básica, como a Finlândia?
Se você me perguntasse isso dez anos atrás, eu diria que os
custos da transição tornariam isso difícil, particularmente em países
maiores como os EUA. Hoje em dia, isso custa menos. Sabemos de
tentativas na África e na Índia, e há uma discussão sobre a introdução
da proposta no Canadá. E já há projetos assim em Utrecht, Holanda.
Houve uma mudança marcante nos últimos anos, com mais países
colocando propostas de renda básica na mesa em sentido legislativo. A
esperança é que introduzir rendas básicas tenha um efeito emancipatório:
isso vai ajudar mais pessoas a se sentirem no controle de suas vidas.
(fonte: http://outras-palavras.net/outrasmidias/?p=242831)
Nenhum comentário:
Postar um comentário