terça-feira, 3 de outubro de 2017

Golpe militar: generais chocam o ovo da serpente

Texto escrito por José de Souza Castro:
Neste momento, quem tem espaço para escrever não pode se omitir diante da revelação do general Antonio Hamilton Mourão de que “as Forças Armadas têm um golpe militar preparado, que há uma conspiração em marcha a fim de destituir o poder civil”, como afirma o filósofo Vladimir Safatle, acrescentando: “Para mostrar que não se tratava de uma bravata que mereceria a mais dura das punições, o comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, descartou qualquer medida e ainda foi à televisão tecer loas a ditaduras e lembrar que, sim, as Forças Armadas podem intervir se o ‘caos’ for iminente.”
Caos é a palavra chave. Sobre isso, raciocina Safatle em seu artigo na “Folha de S.Paulo”, uma semana depois da revelação de Mourão:
“Ao que parece, “caos” seria a situação atual de corrupção generalizada. Só que alguém poderia explicar à população de qual delírio saiu a crença de que as Forças Armadas brasileiras têm alguma moral para prometer redenção moral do país?
Que se saiba, quando seus pares tomaram de assalto o Palácio do Planalto, cresceram à sua sombra grandezas morais do quilate de José Sarney, Paulo Maluf, Antonio Carlos Magalhães: todos pilares da ditadura. Enquanto eles estavam a atirar e censurar descontentes, o Brasil foi assolado por casos de corrupção como Capemi, Coroa Brastel, Brasilinvest, Paulipetro, grupo Delfin, projeto Jari, entre vários outros. Isso mesmo em um ambiente marcado pela censura e pela violência arbitrária.
De toda forma, como esperar moralidade de uma instituição que nunca viu maiores problemas em abrigar torturadores, estupradores, ocultadores de cadáveres, operadores de terrorismo de Estado, entre tantas outras grandes ações morais? As Forças Armadas brasileiras nunca tomaram distância dessas pessoas, expondo à nação um mea-culpa franco.
Ao contrário, elas os defenderam, os protegeram, até hoje. Que, ao menos, elas não venham oferecer ao país o espetáculo patético de aparecerem à cena da vida pública como defensoras de um renascimento moral feito, exatamente, pelas mãos de imoralistas. As Forças Armadas nunca foram uma garantia contra o “caos”. Elas foram parte fundamental do caos.”
Um dia antes, no mesmo jornal, o jornalista Janio de Freitas advertira que, com a contribuição do general Mourão, reforçada com o aviso de que tem a concordância do Alto Comando do Exército, “estamos informados de que o país recuou 53 anos em sua lerda e retardada história. De volta aos antecedentes de tutela armada vividos, com as ameaças, os medos e os perigos cegos do pré-golpe de 1964”.
Como lembra Janio de Freitas, durante o último período da ditadura militar, as ideias na caserna e nas academiais se formaram por processo equivalente a lavagens cerebrais. “Fábricas de posições sem reflexão, apenas ecos de sons vindos do Norte” e, por certo, muitos ainda ocupam níveis mais altos da hierarquia, como o general Mourão. São muitos os Mourões que pensam ser possível derrubar tudo, se têm as armas e não tem ideia do que significa tal decisão. “Essas foram as premissas de todos os golpes militares, fantasiadas ou não”, afirma o experiente colunista da Folha.
Parece-me que estamos vivendo circunstâncias históricas parecidas com as que precederam, na Alemanha da década de 1930, a ditadura de Hitler. Na qual pensadores e políticos alemães diziam que não haveria golpe, por diversas razões. Como é o caso, agora, de um pré-candidato à Presidência da República, Ciro Gomes, para quem “não há condições objetivas para a consumação de qualquer golpe, porque os golpistas atuais estão levando a cabo a agenda internacional e local que interessa aos verdadeiros poderosos”. A declaração pode ser vista aqui.
Os verdadeiros poderosos no Brasil são os banqueiros. Desde o governo Lula, eles nunca lucraram tanto. E jamais foram incomodados por irregularidades praticadas na obtenção de lucros estratosféricos.
Nesse ponto, a análise de Ciro Gomes se enfraquece, considerando-se o que revela aqui a “Folha de S.Paulo”. Se o governo Temer ousar mexer com os bancos sonegadores, alarga-se a possibilidade de um golpe, pois Temer vai perder seu principal ponto de apoio internamente. E parece-me que os Estados Unidos, com Donald Trump, veriam com bons olhos militares brasileiros, dada sua formação direitista, no comando do Brasil.
Ressoa neste momento a famosa frase do general Juracy Magalhães pronunciada quando era embaixador nos Estados Unidos, nomeado pelo general Castelo Branco, o primeiro presidente após golpe de 1964: “O que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”.
Só que não. A entrega de áreas do pré-sal para os Estados Unidos e seus aliados no exterior, por exemplo, não é bom para o Brasil.
Voltando, porém, ao ataque aos bancos sonegadores (que, na minha modesta opinião, não dará em nada, havendo ou não golpe), o que dizem as repórteres Maeli Prado e Flávia Lima:
“A Receita Federal apura se os principais bancos privados do país usam de maneira abusiva, com o objetivo de sonegar impostos, o chamado planejamento tributário.
Diante disso, segundo a Folha apurou, foi montado um grupo de trabalho com 24 auditores de Brasília e São Paulo, onde há uma delegacia especializada em crimes financeiros, para monitorar essas instituições. (…) Os nomes dos bancos estão mantidos em sigilo pois o caso ainda está em apuração.
(…)  Para o órgão, a queda dos tributos pagos pelo sistema financeiro tem atrapalhado uma retomada mais rápida na arrecadação neste ano.
A avaliação, de acordo com uma pessoa próxima ao caso, é que o monitoramento, iniciado no final de julho, já influenciou na alta expressiva das receitas federais observada no mês passado.
A tributação sobre o lucro, com destaque para o IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e o CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), responde por cerca de um terço do total arrecadado pela Receita Federal.
Os bancos são responsáveis pela maior parte desse bolo por serem taxados com maiores alíquotas.
Desde 2014, a Receita identificou um forte descolamento entre os resultados do setor e o desempenho da arrecadação.
O movimento vem se intensificando ano a ano, e atingiu o ápice ao longo de 2017, quando, mês após mês, o volume arrecadado vinha se mostrando distante das projeções da própria Receita.
O Fisco ainda está calculando quanto os bancos podem ter deixado de pagar.
Em 2016, indícios apontam que a perda potencial de arrecadação pode ter ultrapassado os R$ 15 bilhões.
A avaliação é que o quadro piorou neste ano. Segundo palavras de uma pessoa da equipe econômica, o recolhimento feito pelos bancos foi o “principal componente” da arrecadação a flutuar no ano.
Em julho, por exemplo, o recolhimento por estimativa de IRPJ e CSLL das instituições financeiras desabou 67,35%, descontada a inflação do período, em relação ao mesmo mês de 2016.
Essa mesma receita cresceu 43,43% no mês passado, um dos fatores que ajudaram as receitas federais como um todo a subirem mais de 10%.
Durante a divulgação dos dados de agosto, a Receita atribuiu a reação surpreendente da arrecadação não só à recuperação da atividade econômica, mas também a “ações da Receita Federal”.
Imagino a correria, naquela sexta-feira, para pôr panos quentes nesta notícia.

(fonte: https://kikacastro.com.br/2017/10/03/golpe-militar/#more-14476)

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